Prevenção do Suicídio

Prevenção do Suicídio

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Prevenção do Suicídio

 A convite da empresa Itaúba Arquitetura e Construções, que me foi feito através do assistente de marketing Carlos Marra, por ocasião do Setembro Amarelo, mês  dedicado à prevenção do suicídio e da automutilação no ocidente e no Brasil, proferi uma palestra com o tema Prevenção do Suicídio, voltado para um os funcionários.
A palestra teve lugar no canteiro de obras da empresa na tarde do dia 16 de setembro de 2022. O público foi composto em sua quase absoluta maioria por homens entre 25 e 60 anos de idade.
O objetivo foi chamar a atenção para esse tema de modo a que os ouvintes e participantes se sentissem convocados a aumentar os fatores de proteção contra o suicídio para si mesmos e para aqueles com quem convivem.
 O texto que se segue é baseado nessa palestra.

Tema do suicídio: um tabu em superação

Durante muito tempo, evitou-se falar sobre o tema do suicídio porque se pensava que falar sobre isso piorava as coisas ao invés de ajudar. Há alguns anos, pessoas em todo o mundo vem percebendo que é muito importante falar, conversar, fazer reflexões sobre o tema da prevenção do suicídio.

As campanhas pela prevenção do suicídio em vários países, como no Brasil, e em várias cidades, como em Niterói, só começaram quando se percebeu que o início da prevenção começa quando se pode falar sobre problemas subjetivos e emocionais, tais como pensamentos ruins, pensamentos de morte, perda de vontade de viver, sentimentos relacionados à falta de esperança na vida para com isso buscar apoio emocional. Por isso, de alguns anos para cá, o tabu em relação ao tema do suicídio vem diminuindo e nos sentimos mais convocados para falar sobre esse assunto importante e difícil.

De modo que o mês de Setembro foi o eleito para que possamos para um momento e conversar sobre esse assunto para que isso fortaleça nossa segurança e proteção contra o risco de suicídio em nós e naqueles com que convivemos.

 

O suicídio como um problema de saúde pública e relacionado a problemas emocionais

Todos os anos, um grande número de pessoas morre por suicídio no mundo.  Mais de 700 mil pessoas morrem todos os anos por suicídio. Morre-se mais de suicídio do que de homicídios, acidentes de transporte, guerras e conflitos civis.

Desde 2010, o número de suicídios no Brasil, sobretudo entre adolescentes cresceu muito.

Há algumas décadas, o suicídio vem sendo tratado como um problema de saúde pública, relacionado com problemas emocionais, com impactos importantes na sociedade. Desse modo, a cultura dirigindo um olhar cada vez mais atento e cuidadoso para esse fenômeno.

Dentre as faixas de idade, os jovens entre 15 e 29 anos são, dentre as pessoas que morrem por suicídio, os de maior número. O número de jovens dessa faixa de idade que morrem é menor apenas do que o número de mortes de jovens por acidente de trânsito.

O suicídio é uma coisa muito complexa e decorre de vários fatores que atuam juntos, tais como os fatores relacionados à situação psíquica, à situação familiar, conjugal, amorosa e de trabalho.

A prevenção do suicídio é feita com atendimento por um ou mais de um profissional de saúde. A melhor maneira de começar a prevenir o suicídio é lidar com o problema de frente, de maneira sensível e responsável.

O suicídio é um fenômeno que não ocorre de qualquer maneira, e nem é algo que seja irracional, sem motivos e nem sem explicação. Por mais louco que pareça, é possível encontrar motivos racionais para o suicídio, permitindo-nos preveni-lo. Porque o suicídio está ligado a algum significado, sentido. Suas razões podem ser compreendidas. Ele pode ser explicado. O suicídio pode ter significados diferentes. Há significados que são individuais, do íntimo de cada pessoa. Há os significados que estão na nossa sociedade. Há também muitos preconceitos.

Em algum momento, estudos sobre o tema do suicídio começaram a aparecer na cultura. Percebeu-se que o suicídio tem relação com a vida em sociedade. Quanto mais unidas são as pessoas de uma sociedade, quanto menos individualistas, e mais unidos à família, aos amigos, aos vizinhos, à comunidade religiosa e ao trabalho, menor é número de suicídio numa sociedade. Por outro lado, quanto menos unidas são as pessoas, quanto mais individualistas, afastados da família, dos vizinhos, da religião e do trabalho, maior é o número de suicídios de uma sociedade.

Depois, a sociedade começou a perceber que não deveria mais julgar mal o suicídio, mas que precisa ser acolhedora e compreensiva com pessoas em risco de tirar a própria vida. Foi nessa época que se percebeu também que o suicídio está relacionado com o sofrimento mental, isto é, o suicídio estaria relacionado com perturbações psíquicas, tais como a depressão e a melancolia.

 

Suicídio: significado e fatores de risco

O que significa suicídio? Suicídio significa o ato executado pelo próprio indivíduo com a intenção de provocar a sua morte através de um meio que ele acredita que resultará no fim de sua vida. É um ato que provoca uma autolesão fatal com a intenção de morrer.

O suicídio é um fenômeno complexo que é provocado por muitos fatores, ligados ao próprio indivíduo e também á sua vida social (que inclui a vida familiar e em comunidade).

Existem alguns fatores de risco que são sociais:

  • mudanças repentinas da situação social;
  • ausência de suporte social;
  • isolamento social;
  • bullying;
  • cyberbullying;
  • perda do emprego;
  • crises econômicas.

Existem fatores de risco que são individuais:

  • história familiar;
  • vivências difíceis na infância;
  • maneiras de a mente reagir às dificuldades da vida;
  • histórico de ter sofrido negligência, abusos físicos, sexuais;
  • dificuldade de compreender as palavras e atitudes de outras pessoas, especialmente aquelas com quem se tem um laço afetivo;
  • uso de álcool e drogas;
  • aspectos da personalidade;
  • impulsividade;
  • desesperança;
  • alterações psíquicas ou sintomas relacionados aos diagnósticos de depressão, do transtorno afetivo bipolar (TAB), dos transtornos de personalidade, dos transtorno de abuso de substância, da esquizofrenia e transtornos de ansiedade (TA) (essas requerendo uma maior atenção).

O suicídio está envolto em preconceitos que são de nível social e individual e podem trazer prejuízo para os indivíduos. Esses preconceitos podem levar a sentir sentimentos de vergonha, fracasso, rejeição, culpa, isolamento familiar e social, e desesperança. Sendo assim, precisamos ter muito cuidado com a forma de pensar e falar sobre o suicídio para que possamos contribuir para a redução dos preconceitos e aumentar a prevenção do risco de suicídio entre as pessoas que conhecemos. É importante abordar o assunto de forma acolhedora e sensível de modo a auxiliar as pessoas que estejam envolvidas com o risco de suicídio a preservar a vida.

O fenômeno de suicídio é cercado de mitos em nossa sociedade e podem nos pegar e fortalecer ideias que não são produtivas porque não ajudam a tratar o fenômeno de modo a eliminar o risco de suicídio e encorajar a vida.

 

Mitos e verdades sobre o suicídio

 Existem alguns mitos e verdades sobre o suicídio:

  1. As pessoas que tentam suicídio estariam exercendo livremente a sua escolha

Sabemos que muitas pessoas podem estar sofrendo de depressão ao tentarem um suicídio. Pois a pessoa depressiva sofre de uma perturbação no plano subjetivo e emocional no sentido de uma diminuição de interesse por si mesmo, pelos outros e pela vida que afeta sua liberdade de escolha. De modo que dificilmente se pode concordar que uma pessoa depressiva tem liberdade de escolher fazer mal para ela mesma ou não.

  1. Quem quer se matar não fala

A maioria das pessoas que tem a intenção de cometer um suicídio falaram sobre seus desejos de morte com outra pessoa, que pode ter sido um familiar, um amigo, um colega da igreja, um vizinho, um médico ou um psicólogo. Por isso também é tão importante estarmos receptivos para ouvir, acolher e escutar essas pessoas que sofrem de uma dor psíquica.

  1. Todas as pessoas que tentam suicídio são deprimidas

As pessoas com depressão são os que se suicidam em maior número. Entretanto, nem todas as pessoas que tentam suicídio têm depressão, pois podem estar com outros problemas psíquicos ou emocionais, tais como uso e abuso de álcool e outras drogas, diagnosticadas com transtorno de personalidade, ou esquizofrenia. Vale ressaltar que pessoas sem um diagnóstico médico ou psicológico também pode fazer tentativa de suicídio.

  1. Perguntar a uma pessoa sobre seus desejos de morte aumenta o risco de realizá-lo.

É o contrário, pois falar sobre suicídio com uma pessoa com tal tendência, ao invés de piorar, reduz o risco de tentativa de suicídio.

  1. Os que tentam suicídio não se suicidam

Isso não é verdade. Mais ainda, quem faz uma tentativa de suicídio tem a tendência a tentar novamente ao longo da vida.

  1. Não devemos falar sobre suicídio, pois isso pode aumentar o risco.

Falar sobre suicídio não aumenta o risco. Ao contrário: falar com alguém sobre o assunto pode aliviar a angústia e a tensão que esses pensamentos trazem.

Para enfrentar o problema do suicídio, precisamos adotar uma postura acolhedora, sensível, assim como contribuir para que mais pessoas saibam sobre esse assunto, sobre os seus fatores de risco e também como ampliar e fortalecer a segurança para a preservação da vida.

 

Suicídio entre homens e mulheres

 As tentativas de suicídio no mundo ocorrem com mais frequência em mulheres. Porém, o número de suicídios em homens é três vezes maior do que em mulheres. A prevalência de tentativas de suicídio é maior em mulheres, mas a de suicídio é muito maior em homens.

No Brasil, ocorre o mesmo. O número de suicídios em homens é quase quatro vezes maior do que em mulheres.

Isso é explicado pelo fato de que homens se isolam mais, tem mais dificuldades em procurar ajuda para suas dificuldades, enquanto as mulheres usam mais fatores de proteção, são mais receptivas à ideia de que esteja com alguma dificuldade emocional e são mais propensas a procurarem tratamentos para suas dificuldades emocionais e transtornos psíquicos.

Os homens têm a aprender com as mulheres a se cuidar: as mulheres sofrem menos estigma do que homens por procurarem ajuda e tratamento com profissional para suas dificuldades subjetivas e emocionais porque em geral são mais receptivas a ideia de estarem com dificuldades emocionais e mais propensas a falar sobre isso com outra pessoa, inclusive com um profissional.

Elas apontam que os fatores de proteção podem ser decisivos para evitar o suicídio. Destaco dois desses fatores de proteção:

  • estar em convivência com outras pessoas, tais como na família, com os vizinhos, na comunidade religiosa, na comunidade escolar dos filhos;

buscar tratamento com um profissional de saúde.

 

Busca de ajuda: quando e como?

Com muita frequência, os incômodos emocionais, o sentir-se mal se inicia na vida das pessoas muito antes de ocorrer uma tentativa de suicídio. Se eles se agravam ao ponto de chegar a esse fenômeno que atinge a própria vida, é porque ou não foram valorizados ou as pessoas que sofrem não puderam procurar ou receber ajuda necessária.

Por isso, é recomendável que as pessoas que estejam passando por impasses, dificuldades, questões emocionais procurem uma profissional de saúde para superá-los.

Quando surgem tristezas que não passam, perda de interesse pelas coisas da vida, baixa autoestima, sentimentos ruins sobre si mesmo, tal como o sentimento de culpa, sentimentos de não saber o que fazer da vida, ou de que se está numa situação difícil e sem saída no trabalho, na família, no amor, ou então pensamentos de que seria melhor deixar de viver, é recomendável procurar um profissional de saúde.

Esse profissional é preferencialmente um psicanalista, psicólogo, ou psiquiatra. Muitas vezes, no entanto, outros profissionais de saúde podem oferecer auxílio de modo pontual.

Existem alguns diagnósticos feitos por médicos e psicólogos que já estão muito associados ao risco de suicídio. As pessoas que sofrem de uso e abuso de álcool e substâncias psicoativas ou que, por algum motivo, receberam o diagnóstico de transtorno afetivo bipolar, transtorno de ansiedade, depressão, esquizofrenia com frequência já passaram por alguma atenção profissional, sobretudo psiquiatras e psicólogos. A recomendação é que continuem recebendo ou procurem essa atenção profissional enquanto ela for importante para tratar o mal estar.

Muitas pessoas pensam que psicólogos e psiquiatras são apenas para pessoas consideradas loucas. Já ouvi muitas vezes: “psicólogo é para maluco. Essa ideia é um preconceito contra psicólogos e contra loucos.

No entanto, diversas vezes ouvi que “todo mundo deveria fazer terapia”, ou “todo mundo precisa ir alguma vez ao psicólogo”. Isso é um exagero. No entanto, existem bons motivos para qualquer pessoa procurar um psicólogo ou um psiquiatra.

Nesse momento, vou falar rapidamente sobre os motivos para procurar um psicólogo.

Em primeiro lugar, quando alguém está passando por alguma dificuldade emocional, ela está precisando falar com alguém. Quando nem a família, nem os amigos, nem os colegas e nem Deus conseguem ouvir de modo a acalmar a pessoa com problemas emocionais e em sofrimento, o psicólogo oferece uma escuta sem julgamentos, sem críticas, voltada, para começar, a ajudar quem o procura a sair da situação emocional difícil e encontrar um caminho que a pessoa acredite que seja bom para a sua vida. E dali em diante, a pessoa pode desenvolver a mente para se tornar mais forte para lidar com os problemas da realidade da vida.

A vida é árdua para todos que trabalham, amam e vivem numa sociedade repleta de conflitos, dúvidas, frustrações, insatisfações, decepções, riscos e perigos. Todos estamos suscetíveis a sofrer traumas e se deixar envolver em tramas que enfraquecem a nossa mente.

Mas ocorre também que os traumas não vêm apenas da vida fora de nós, mas de lembranças, perdas das quais não se curou. Nós não dominamos a mente. A mente é que nos domina através de uma compulsão de lembrar, a sonhar, a ficar pensando em lembranças e situações que não gostamos e quando isso ocorre de modo muito forte, ela retira da mente o ânimo de viver.

Por isso, para se recuperar é preciso procurar a ajuda de alguém que possa escutar para que a pessoa que sofre recupere a capacidade de lidar com os problemas emocionais e acalmar essa forma da mente agir contra a vida para que possamos continuar o caminho a favor da vida. Esse alguém capaz de escutar para ajudar é, na maioria das vezes, psicanalista e psicólogo, mas também psiquiatra, que, cada um na sua área, estudam e trabalham para ajudar cada pessoa que os procura a recuperar e fortalecer a vontade de viver, encontrar um caminho bom, uma vida mais longa.

 

Links úteis

Fontes

BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Boletim Epidemiológico 33. Vol. 52. Set., 2021. Disponível em: https://www.gov.br/saude/pt-br/centrais-de-conteudo/publicacoes/boletins/epidemiologicos/edicoes/2021/boletim_epidemiologico_svs_33_final.pdf. Acesso em 16 set. 2022.

FREUD, S. Além do Princípio do Prazer. 1 ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2020. (Obras Incompletas de Sigmund Freud).

QUESADA, Andrea Amaro. Suicídio na Atualidade. Fortaleza: Fundação Demócrito Rocha, 2020. (Curso de Prevenção ao Suicídio; Fascículo 1).

______. Impactos sociais do suicídio e a necessidade de políticas públicas. Fortaleza: Fundação Demócrito Rocha, 2020. (Curso Prevenção ao Suicídio; fascículo 2).